Não há nada que não possa piorar
Não há nada que não possa piorar
Por Marcondes Dias Barbosa
Diretor Previdenciário da Abam
Pós-Graduado Lato Sensu em Prática Previdenciária pela Faculdade Verbo Educacional
Tramita no Congresso Nacional a PEC 66/2023, cujo objetivo inicial era abrir novo prazo para renegociação das dívidas dos municípios com o Regime Geral de Previdência Social e com seus Regimes Próprios de Previdência Social dos Servidores Públicos.
Com articulação da Confederação Nacional de Municípios (CNM), em maio deste ano alguns Senadores apresentaram uma emenda em plenário para tornar obrigatória pelos estados, Distrito Federal e municípios, a observância das mesmas regras previdenciárias aprovadas pela Emenda Constitucional nº 103/2019.
A PEC foi aprovada em dois turnos pelo Senado e encontra-se na Câmara dos Deputados desde o dia 21 de agosto.
Como diz o título, não há nada que não possa piorar. Todos os estados brasileiros promoveram as suas reformas, para adequação à última reforma previdenciária do País, assim como a maioria das Capitais e diversos outros municípios, e todos instituíram algum benefício aos seus servidores, alguns mais, outros menos, dependendo da saúde financeira de cada um.
Com a proposta atropelante dessa Emenda, vem uma verdadeira contrarreforma previdenciária para os entes referidos, que acabaram de conquistar na própria EC 103/2019 as suas autonomias para o tratamento adequado aos seus servidores.
Essa Emenda está sendo combatida por todas as entidades de classe dos servidores da União, Estados, Municípios e Distrito Federal. Como já é do conhecimento geral, esta semana foi emitida Nota Pública à Nação Brasileira contra a PEC 66/2023, assinada por mais de 100 (cem) entidades representativas.
Eis a redação dos dispositivos “corpos estranhos” que foram inseridos na PEC 66/2023
Art. 1º A Constituição Federal passa a vigorar com as seguintes alterações:
“Art. 40-A. Aos regimes próprios de previdência social dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios aplicam-se as mesmas regras do regime próprio de previdência social da União, exceto se preverem regras mais rigorosas quanto ao equilíbrio financeiro e atuarial.
Parágrafo único. O disposto no caput deste artigo, quanto à aplicação das mesmas regras do regime próprio de previdência social da União, inclui as regras de:
I – idade e tempo de contribuição mínimos, cálculo de proventos e pensões, alíquotas de contribuições e acumulação de benefícios, além de outros aspectos que possam impactar o equilíbrio a que se refere o caput deste artigo; e
II – transição para os atuais servidores e as regras transitórias aplicáveis tanto para esses quanto para aqueles que venham a ingressar no serviço público do ente federativo.”
…
Art. 3º Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios deverão promover, em até 18 (dezoito) meses após a data da promulgação desta Emenda Constitucional, alterações na legislação interna relacionada ao respectivo regime próprio de previdência social para prever, no mínimo, as mesmas regras do regime próprio de previdência social da União a que se refere o art. 40-A da Constituição Federal.
Parágrafo único. Para os Estados, o Distrito Federal e os Municípios que não promoverem as alterações a que se refere o caput deste artigo em até 18 (dezoito) meses após a data da promulgação desta Emenda Constitucional, passam a vigorar as mesmas regras do regime próprio de previdência social da União a que se refere o art. 40-A da Constituição Federal.
Recapitulando, a EC 103 fixou normas gerais e comuns a todos os entes, mas concedeu autonomia aos estados, Distrito Federal e municípios para estabelecerem regras mais benéficas aos seus servidores, mediante emenda às respectivas Constituições e Leis Orgânicas.
Como se vê, então, a proposta da PEC 66/2023 acaba como essa autonomia, obrigando que os Entes que concederam algum benefício previdenciário a seus servidores, revejam a legislação própria no prazo de até 18 (dezoito) meses, sob pena de tê-la derrogada por força desse comando constitucional.
Analisando a Lei Complementar de Salvador, LC 75/2020, destacam-se diversos benefícios concedidos, que deverão ser revistos, caso essa famigerada alteração constitucional seja promulgada.
– Idade mínima para aposentadoria
Redução em um ano a idade mínima para aposentadoria, 61 anos para mulher e 64 para homens;
– Cálculo dos proventos das aposentaddorias
Média aritmética simples das remunerações adotadas como base para as contribuições correspondentes a 90% (noventa por cento) dos maiores salários de contribuição, ao invés de 100 (cem por cento);
– Idade mínima para aposentadoria na transição
Redução em dois anos a idade mínima para aposentadoria de servidores que ja estavam no serviço público na data da Lei Comlementar municipal, em relação a regra da LC 103/2019, isto é, 54 (cinquenta e quatro) anos para mulher e 59 (cinquenta e nove) para homens, além da redução em 05 (cinco) anos o tempo mínimo exigido de efetivo exercício no serviço público, 15 (quinze) anos, ao invés de 20 (vinte).
Para os professores que já estavam no serivços público, a LC 75/2020 estabeleceu a redução em 05 (cinco) anos, para ambos os sexos, os requisitos de idade e tempo de contribuição e, em 10 (dez), a quantidade de pontos, para os que comprovarem exclusivamente tempo de efetivo exercício das funções de Magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio.
– Somatório do pontos
No requisito somatório da idade e do tempo de contribuição, que acresce 01 (um) ponto a cada ano, até atingir o limite de 100 (cem) pontos, se mulher, e de 105 (cento e cinco) pontos, se homem, na legislação de Salvador é acrescido 01 (um) ponto a cada 01 (um) ano e 03 (três) meses, com a redução do limite até 96 (noventa e seis) pontos, se mulher, e de 104 (cento e quatro) pontos, se homem, além da redução de (dez) pontos, para ambos os sexos, para o Magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio.
– Cálculo dos proventos do servidor que ingressou no sp antes de 31.12.2003
Redução da idade em em 01 ano, para 61 (sessenta e um) e 64 (sessenta e quatro) anos, para aposentadoria de mulheres e homens, respectivamente, na hipótese do cálculo pela totalidade da remuneração do servidor público no cargo efetivo em que se der a aposentadoria, que não tenham feito opção pelo regime de previdência complementar.
O § 1º do art. 4º, da EC 103, dispôs que a partir de 1º de janeiro de 2022, a idade mínima para a aposentadoria voluntária será de 57 (cinquenta e sete) anos de idade, se mulher, e 62 (sessenta e dois) anos de idade, se homem e, para os professores, 52 (cinquenta e dois) anos, se mulher, e 57 (cinquenta e sete), se homem. A LC 75/2020 não referendou essa imposição, possibilitando que haja alguma hipótese com o limite menor.
– Pedágio para atingir o tempo mínimo de contribuição
A LC 75/2020 estabelceu um período adicional de contribuição correspondente a 60% (sessenta) por cento do tempo que faltaria para atingir o limite de 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher, e 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem; na EC 103 esse pedágio é de 100 % (cem por cento).
– Pensão por morte
Na conessão de pensão por morte, a cota por dependente na LC 75/2020 é de 15 % (quinze) por cento, ao invés de 10% e o número de dependentes será igual ou superior a 4 (quatro) na preservação do valor de 100% (cem por cento) da pensão por morte, ao invés de 5 (cinco).
– Abono de permanência
Quanto ao abono de permanência, que poderia ser o equivalente a até 100% (cem por cento) do valor da contribuição previdenciária, a LC 75/2020 optou por limitá-lo a 80% (oitenta) por cento, devendo ser mantido esse percentual por ser regra mais rigorosa.
Esse, portanto, são alguns dos benfícios que terão que ser revogados pelo Município de Salvador, expressa ou tacitamente, caso seja promulgada a Emenda Constitucional em comento, em prejuízo aos seus servidores.